Por: Jono Bacon
Tradução: Bruno Ferreira
Recentemente o
Projeto LibreOffice liberou a versão 5.0 de sua suíte office
multi-plataforma. A nova versão trás vários recursos típicos de
uma suíte de escritório bem elaborada e que roda em ambientes Linux,
Windows, Mac e em dispositivos móveis.
Falar LibreOffice
ou OpenOffice para o público em geral pode levar a reações
iteressantes. Para algumas pessoas, LibreOffice é o queridinho do
mundo do software livre, e para outros, é a cópia mal feita do
Microsoft Office que eles olham com desconfiança.
Eu acredito que o
LibreOffice alcançou uma função importante no mundo, e que vai
além da mera função de uma suíte de escritório. Mas, antes de
chegarmos a isso, é importante que olhemos para trás através da
imensa jornada que levou o Projeto LibreOffice ao que conhecemos
hoje.
Voltando no Tempo
A história começa
em 1985, quando Marco Börries criou o StarWriter para o Zilog Z80.
Posteriormente ele fundou a StarDivision e começou a construir o que
hoje é conhecido como suíte de escritório moderna. O fruto desse
esforço foi o StarOffice, que unia funções de editor de textos,
planilha eletrônica, gerador de apresentações, banco de dados,
software de desenho, fórmulas e outras ferramentas.
Nos anos iniciais do
Linux, o StarOffice era a única suite de escritório bem
desenvolvida disponível para esse sistema. Era desajeitada e feia,
mas funcionava bem e desempenhou uma função importante para os
novos usuários Linux. Nunca esquecerei a possibilidade de criar um
cartaz para meu grupo de usuários Linux e imprimí-lo, o que era na
época um grande passo adiante para o Linux.
Em 1999, a Sun
comprou a StarDivision por 73,5 milhões de dólares e, de acordo com a imprensa,
comprar toda a companhia foi mais barato que pagar licenças do
Microsoft Office para os funcionários da Sun. E isso veio
naturalmente com uma vantagem: a Sun agora teria sua própria suíte
de escritório.
A Sun seguiu fundo
na filosofia software livre e liberou o código do StarOffice em
2000, e esta iniciativa se transformou no Projeto OpenOffice.org.
Primeiramente foi apenas a liberação do código, mas logo uma
comunidade formou-se ao redor do projeto e tentou evoluir como uma
comunidade de software livre. Eu estava em contato próximo com ambas
as comunidades, OpenOffice.org e Sun Community, e rapidamente vi as
coisas complicarem.
Tempos Difíceis
Apesar de termos uma
dívida de gratidão para com a Sun, por abrir o código do
StarOffice, isso significou liberar um gigantesco bloco de código
monolítico e rústico que poderia afugentar o mais impetuoso
programador. As pessoas que se juntaram ao projeto OpenOffice.org
nesses dias assumiram a tarefa complexa, ingrata e mentalmente
desgastante de entender aquele enorme código espaguete e prepará-lo
para futuro desenvolvimento. Eles foram verdadeiros heróis do mundo
do software livre.
A Ximian foi uma das empresas
envolvidas no projeto. Michael Meeks, um importante membro do projeto
OpenOffice.org, criou um patch específico, chamado ooo-build, que
tornava a gerência do código no Linux mais fácil. Isso resultou em
um software chamado go-ooo, que incluía alguns recursos que não
existiam no código original do OpenOffice.org.
Nesse tempo, a Sun
estava contribuindo menos com o projeto, possivelmente porque os
objetivos financeiros e administrativos mudaram. Para piorar as
coisas os responsáveis pelo OpenOffice.org na Sun respondiam menos
às contribuições de código externas. Isso criou um ambiente em
que Michael Meeks e outros desenvolvedores trabalhavam duro para
criar uma suíte de escritório que o mundo do software livre pudesse
se orgulhar, mas esse esforço falhava por falta de resposta.
Lembro desses tempos
claramente. Michael Meeks fazia tudo que podia para inspirar e
encorajar a Sun a gerenciar o OpenOffice.org de forma que fosse mais
de acordo com um projeto de software livre. Eu até passe algum tempo
com Michael tentando conversando com pessoal da Sun, e tentando que a
Canonical ajudasse. Infelizmente esse esforço não trouxe muito
resultado. Para falar a verdade eu estava a par de várias das
considerações internas na Sun, e sua relutância em se envolver
pode ter sido resultado de grupos de gestão externos e recursos de
engenharia limitados.
Em 2010, a Oracle
adquiriu a Sun. Isso causou ondas de choque pela comunidade de
software livre e pode ter sido o que colocou a locomotiva novamente
nos trilhos. Ainda nesse ano a organização Document Foundation
foi anunciada como novo hospedeiro do trabalho derivado do
OpenOffice.org, o LibreOffice. Esse seria o novo projeto de software
livre pelo qual Meeks e companhia tanto haviam lutado.
Uma Nova Era
Desde esses dias, o
LibreOffice tem se fortalecido mais e mais. Aquele enorme código
monolítico foi modularizado, atualizado e refinado. O suporte
multiplataforma foi expandido, novos recursos adicionados,
redundâncias removidas, e uma visão de simplicidade e usabilidade
aplicada. Além disso, uma nova comunidade nasceu, cenferências e
encontros de desenvolvedores foram fundados, patrocinadores surgiram,
e outras comunidades – como de documentadores, escritores,
tradutores, artistas, designers – criadas.
Olhar para o
LibreOffice e compará-lo com o Microsoft Office pode ser tentador.
Certamente, o LibreOffice não provê o mesmo nível de recursos e
finesse, que o segundo apresenta, mas quando pensamos no
“antes e depois” desde os anos 1999 até hoje, o que a comunidade
alcançou é fenomenal. Desenvolver o LibreOffice tem sido um
trabalho difícil, tecnicamente desafiador, e algumas vezes
desmotivante, e contribuições tem sido feitas por milhões de
usuários ao redor do mundo.
Mais que uma
Suíte
Além das tremendas
realizações técnicas da comunidade LibreOffice, o projeto
desempenha uma grande missão além mundo do software livre. Estamos
vendo uma grande renascença do espírito de comunidade no mundo.
Pessoas estão se unindo para criar, compartilhar e colaborar de
novas e interessantes formas. Uma coisa que aprendi em minha
carreira é que qualquer missão ou visão é possível quando temos
o conjunto correto de ferramentas, conhecimento e pessoas. O conjunto
“ferramentas” é onde se encontra o LibreOffice.
Nos dias iniciais do
surgimento do Linux e do software livre, um conjunto de ferramentas
permitiu que muito do que temos hoje fosse possível. Entre essas
ferramentas estão o gcc, make, binutils, e outras peças do sistema
GNU. Sem elas, disponíveis livremente, desenvolvedores não teriam
como realizar muitas coisas.
Comunidades de
software livre não trabalham apenas desenvolvendo software. Elas são
grupos locais, esforços de ativismo, escrita colaborativa, modelagem
de dados e mais. Como era nos dias iniciais dos projetos de software
livre, ferramentas abertas, disponíveis livremente e conteúdo
hackeável são imprescindíveis. O LibreOffice está fornecendo a
ferramente livre que pode inspirar uma geração a criar conteúdo
aberto em formatos abertos.
Por exemplo, para
auxiliar a criar grupos locais cordenados ao redor do mundo, devemos
ter kits de materias, disponíveis livremente por download, que esses
grupos possam usar para criar cartazes, documentos, crachás,
autocolantes etc. Prover material é uma coisa, mas prover material
num formato que possa ser utilizado, editado e customizado com uma
ferramenta livre significa que comunidades não precisarão se
preocupar em comprar uma suíte de escritório proprietária.
Uma combinação de
formatos e ferramentas abertos levou à revolução colaborativa que
vemos hoje. Apesar de ser tentador ver o LibreOffice como mero
substituto livre do Microsoft Office, essa linha de pensamento
subestima a incrível missão que aquele pode desempenhar na
revolução do desenvolvimento de software.
Ao terminar essa
coluna hoje à noite, estarei saudando meus amigos do Projeto
LibreOffice. Vocês são a esência do que amo no código livre: a
gentileza, experiência, e senso de comunidade que faz isso tão
especial. Obrigado pela sua devoção e esforço.
Artigo Original por
Jono Bacon:
http://opensource.com/life/15/8/libreoffice-community-achievements
Tradução livre:
Bruno Ferreira.
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